A leucemia é um tipo de cancro no sangue que afeta os glóbulos brancos, os principais participantes na defesa do corpo contra infeções, e a medula óssea, o centro do osso onde as células são produzidas.
Na leucemia, esses glóbulos brancos tornam-se anómalos e são incapazes de amadurecer; assim, começam a acumular-se na medula óssea até que, eventualmente, atingem um estágio em que entram na corrente sanguínea.
Existem dois tipos principais de leucemia: a leucemia aguda, de crescimento rápido, e a leucemia crónica, de crescimento lento. Estes dois tipos principais podem ser subdivididos, dependendo do tipo de célula sanguínea afetada pela leucemia. Por exemplo, a leucemia mieloide aguda afeta células do fundo mieloide, mas a leucemia linfocítica aguda afeta as que fazem parte da linhagem linfoide.
A leucemia infantil tende a ser quase sempre aguda, sendo mesmo o tipo de cancro mais comummente diagnosticado em crianças; a leucemia linfoblástica aguada representa mais de um quarto de todos os cancros infantis.
A taxa de sobrevivência a 5 anos, que representa a percentagem de pacientes que vivem por, pelo menos, 5 anos após o diagnóstico, melhorou bastante ao longo dos anos e, atualmente, é de 91%. Por outro lado, a taxa de sobrevivência a 5 anos para outros tipos de leucemia é de apenas 66%.
De acordo com Katrin Ottersbach, da Cancer Research UK, a leucemia infantil “é uma doença complexa cuja causa exata é desconhecida na maioria dos pacientes. Crianças que desenvolvem leucemia geralmente não apresentam fatores de risco conhecidos associados à doença. Apesar disso, foram feitas descobertas científicas inovadoras para definir os principais genes da leucemia e revelar a complexidade subjacente ao desenvolvimento e progressão desta doença”.
Alterações no ADN, a substância química dentro das células que compõe os genes e que controla a forma como as células funcionam, podem resultar numa diminuição da capacidade de as células funcionarem adequadamente, o que pode fazem com que elas se desenvolvam de forma descontrolada, tornando-se tornem cancerígenas.
“Existem vários tipos de alterações no ADN que podem fazer com que uma célula se torna cancerígena; uma delas é conhecida como translocação cromossómica e tende a ocorrer antes do nascimento na leucemia infantil. Os cromossomas, dos quais existem 23 pares, são responsáveis pela forma como as células organizam o ADN. Quando ocorre uma translocação, o ADN de um cromossoma rompe-se e liga-se a outro cromossoma. Em alguns casos, essa translocação é suficiente para iniciar a leucemia. No entanto, na maioria dos casos, é necessário um evento pós-natal para o desenvolvimento da doença. Por exemplo, as alterações no ADN devido à translocação podem levar ao desenvolvimento de um oncogene, genes que codificam proteínas que ajudam as células a permanecerem vivas, crescerem ou se dividirem de maneira anormal e que, assim, se tornam cancerígenas.”
Os genes de fusão são um tipo de oncogene que ocorre quando dois genes, anteriormente separados, se juntam para formar um novo gene híbrido. Um exemplo disso na leucemia mieloide aguda é a leucemia reorganizada por MLL-AF9, um rearranjo que tende a ser mais associado à leucemia infantil.
Esta situação, de acordo com estudos, ocorre devido a uma translocação entre os cromossomas 9 e 11: essa translocação leva à formação do gene de fusão MLL-AF9 que, quando transcrito, produz a proteína de fusão MLL-AF9. Essa proteína causa desregulação na célula e pode iniciar o desenvolvimento de leucemia.
“A função do sistema imunitário é combater a infeção, mas, para que ele funcione corretamente, é necessário que seja exposto à infeção logo no início da vida”, explica Katrin.
Existem outras causas de leucemia, relacionadas à genética, que podem aumentar o risco de uma criança desenvolver leucemia: um dos mais comuns é a síndrome de Down.
“É aqui que a divisão celular anormal no início do desenvolvimento produz uma cópia extra do cromossoma 21. Estas crianças têm um material genético extra que leva a alterações no desenvolvimento de caraterísticas de um indivíduo com Síndrome de Down. Crianças com síndrome de Down têm 150 vezes mais probabilidade de desenvolver leucemia mieloide aguada e são 33 vezes mais propensos a desenvolver leucemia linfoblástica aguda.”
Outros estudos sugerem que a causa da leucemia se deve a uma combinação de mutações genéticas e exposição a infeções. Esse processo de duas etapas envolve primeiro uma mutação genética que ocorre antes do nascimento, predispondo a criança à leucemia. Um número marginal de crianças (apenas 1%) que nascem com essa mutação realmente desenvolve a doença, mostrando a importância do segundo passo nesse processo para o desenvolvimento da doença. Acredita-se que essa mutação não seja herdada e provavelmente é um acidente de desenvolvimento. O segundo passo envolve a exposição da criança a uma ou mais infeções comuns, levando ao início da doença.
O professor Mel Greaves, do Institute of Cancer Research, dedicou toda a sua vida a pesquisar o porquê de as crianças desenvolverem leucemia.
Para este investigador, “o problema não é a infeção, mas sim a falta de infeção no início da vida”, uma teoria denominada de “teoria da infeção retardada” que se acredita ser a causa da leucemia linfoblástica aguda.
“A função do sistema imunitário é combater a infeção, mas, para que o nosso sistema imunitário funcione corretamente, ele precisa de ser exposto a infeções logo no início da vida. Acredita-se que uma infeção mais tarde na vida, sem preparação prévia, pode causar um mau funcionamento do sistema imunitário, que irá reagir de uma forma exagerada; essa reação envolve a produção de produtos químicos, conhecidos como citocinas, na corrente sanguínea, que podem resultar no desenvolvimento de leucemia em crianças portadoras da primeira mutação.”
Apesar das inúmeras pesquisas realizadas, a verdade é que a causa exata da leucemia infantil ainda é desconhecida.
Fonte: RTE