Na passada terça-feira, e como forma de assinalar o Setembro Dourado – mês da consciencialização para o cancro infantil – a associação Acreditar lançou uma petição que propõe alargar o período de luto pela perda de um filho de 5 para 20 dias.
Segundo a associação, o lançamento desta petição (a primeira ao longo dos 27 de existência da Acreditar) prende-se com o facto de esta se tratar de “uma questão muitíssimo forte”.
Na lei portuguesa, e de acordo com o Código do Trabalho (Art.ºs 249.º e 251.º da Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro e suas subsequentes alterações) prevê-se um regime de falta justificada para situações de luto parental de 5 dias consecutivos.
“5 dias não dá quase para tratar das tarefas burocráticas que estão inerentes à morte “, explicou Margarida Cruz, Diretora Geral da Acreditar.
“É por isso que lançámos esta petição com o mote ‘o luto de uma vida não cabe em 5 dias’ e esperamos que toda a sociedade portuguesa entenda a legitimidade e a justiça daquilo que está inerente a esta petição e se associe a nós para que consigamos mudar as coisas”.
A iniciativa deste ano foi lançada a pensar nos cuidadores que “nem sempre estão em igualdade de circunstâncias com outras pessoas sobretudo porque estão em situações muito fragilizadas e merecem também um cuidado especial”.
Segundo a associação, a maioria dos pais em luto depende muito “da compreensão das entidades patronais” para que lhe seja concedido um período de tempo que os ajude a recuperar não só psicologicamente, mas também fisicamente.
João de Bragança, Presidente da Acreditar, relembra que “serviram para pouco, para quase nada”, os 5 dias a que teve direito, há mais de 20 anos, após a morte da sua filha de 7 anos.
“Em 5 dias faz-se o imediato, o urgente, tantas vezes o burocraticamente inadiável. Damos uma camada de tinta à alma e ao corpo, não lhe damos novas fundações. Não nos preparamos para o futuro, por absoluta falta de tempo”, disse o primeiro signatário desta petição.
Mauro Paulino e Sofia Gabriel, do Instituto de Psicologia Clínica e Forense, alertam que “o luto por um filho tende a ser mais prolongado do que outros lutos, pois pode durar toda uma vida”, apesar de os sintomas estarem “particularmente presentes nos primeiros 6 meses [após a morte do filho]”.
Ainda assim, “a maioria dos pais vivencia sintomas de depressão e de stresse pós-traumático vários anos após a perda”.
Para os investigadores, e apesar de o Código do Trabalho não poder “abranger a universalidade das situações”, a verdade é que “à luz da ciência psicológica, um prazo de 5 dias é manifestamente insuficiente para a intensidade do trauma de perder um filho”.
Este foi o caso de Filipa Silveira e Castro, membro da direção da Acreditar, que perdeu o seu filho há 8 anos. Esta mãe, que 4 dias após a morte do seu filho foi chamada para regressar ao trabalho (tendo sido posteriormente dispensada do serviço), afirma que os “5 dias de facto não chegam para nós, pais, digerirmos aquilo que se passou, ainda estamos naquela fase de negação, estamos incrédulos”.
Em Portugal, todos os anos, cerca de 400 crianças são diagnosticadas com cancro, sendo a taxa de sobrevivência de cerca 80%.
Até ao momento, a petição conta já com mais de 400 assinaturas. Para ser discutida em plenário são precisas 7 500. Dê o seu contributo, aqui.
Fonte: Fundação Rui Osório de Castro