As selenoproteínas, essenciais para várias funções biológicas como o suporte ao sistema imunitário e a regulação de processos metabólicos, podem ser aproveitadas pelas células cancerígenas para evitar a sua destruição. Uma dessas proteínas, a glutationa peroxidase 4 (GPX4), desempenha um papel crucial na proteção celular e na sobrevivência das células tumorais.
“Esta capacidade protetora da GPX4 dificulta os tratamentos oncológicos padrão, pois a sua atividade promove estados de resistência aos fármacos”, explica Pedro Friedmann Angeli, da Universidade de Würzburg, na Alemanha.
No entanto, a investigação liderada pela sua equipa sugere que a inibição da produção de GPX4 pode ser uma estratégia promissora, especialmente no tratamento do neuroblastoma, um tipo de cancro pediátrico.
Investigação sobre enzimas na produção de selenoproteínas
Os investigadores identificaram um novo mecanismo de produção de selenoproteínas que não depende da enzima anteriormente considerada indispensável, a selenocisteína liase (SCLY). Descobriram que outra enzima, a peroxirredoxina 6 (PRDX6), atua como um transportador de selénio, permitindo a produção de selenoproteínas, mesmo na ausência da SCLY.
Através de técnicas como a espectrometria de massa e a edição genética CRISPR-Cas9, a equipa demonstrou que a PRDX6 se liga diretamente ao selénio e desempenha um papel crucial no transporte deste elemento. No entanto, apesar de substituir a SCLY em algumas funções, a PRDX6 não é capaz de realizar o mesmo processo específico de libertação do átomo de selénio.
“Queremos investigar quais outros componentes podem colaborar com a PRDX6 na manutenção da produção de selenoproteínas”, explicou Zhiy Chen, autor principal do estudo. Além disso, os investigadores estão a trabalhar no desenvolvimento de inibidores moleculares que possam atuar simultaneamente sobre a SCLY e a PRDX6, para enfraquecer as células tumorais.
Através de técnicas de ponta, como a espetrometria de massa e a genómica funcional baseada em CRISPR-Cas9, a equipa de investigação descobriu que a PRDX6 se liga diretamente ao selénio e actua como um transportador, ou “vaivém”, para o oligoelemento, permitindo a produção de novas selenoproteínas. O estudo também demonstrou que a inibição da PRDX6 pode prejudicar a sobrevivência das células cancerígenas, especialmente nos neuroblastomas, oferecendo um novo alvo terapêutico potencial.
Curiosamente, a equipa descobriu que, embora a PRDX6 possa compensar a ausência de SCLY, não possui a atividade específica presente na SCLY necessária para remover o átomo de selénio dos seus precursores. O grupo de Friedmann Angeli pretende investigar que outras proteínas colaboram com a PRDX6 para manter a síntese de proteínas de selénio. Além disso, está no horizonte o desenvolvimento de inibidores moleculares que visem tanto a SCLY como a PRDX6, com o objetivo de melhor impedir o crescimento das células cancerígenas.
Potencial terapêutico no tratamento de neuroblastomas
A inibição da PRDX6 revelou-se particularmente eficaz na redução da sobrevivência das células de neuroblastoma, abrindo caminho para o desenvolvimento de terapias direcionadas. Estão em curso esforços para criar inibidores moleculares que atuem simultaneamente na SCLY e na PRDX6, com o objetivo de limitar o crescimento de células cancerígenas.
Colaboração internacional
O estudo contou com a participação de parceiros de renome, incluindo a Universidade de São Paulo (Brasil), e duas instituições alemãs: o Instituto de Tecnologia de Células Estaminais e Medicina Experimental em Heidelberg, e o Centro Alemão de Investigação do Cancro.
O artigo foi publicado na revista Molecular Cell.
Estas descobertas representam um passo importante na investigação sobre o neuroblastoma e outros cancros pediátricos, apontando para novas abordagens terapêuticas que podem melhorar significativamente os resultados para jovens pacientes.
Fonte: PHYS ORG