Investigadores canadianos seguiram a sua intuição de que um medicamento, inicialmente destinado a tratar pessoas com insuficiência cardíaca, poderia ser eficaz no tratamento do cancro.
E essa intuição deu frutos, como demonstrado pelo trabalho publicado no Journal of Experimental and Clinical Cancer Research.
“Alguns medicamentos projetados para certas indicações terapêuticas podem ser usados para outras doenças; isso é chamado de reposicionamento de fármacos. Como esses medicamentos já passaram pelas etapas críticas de aprovação em toxicologia, segurança pré-clínica, farmacocinética, entre outros, representam uma vantagem real em iniciar novos ensaios clínicos o mais rapidamente possível”, disseram os investigadores da Universidade de Montreal, no Canadá.
“Neste estudo conseguimos observar pela primeira vez as propriedades anticancerígenas e epigenéticas da proscillaridina A, um cardiotónico usado no tratamento da insuficiência cardíaca ou arritmia cardíaca, em crianças com leucemia que expressam o gene MYC. Quando submetido a mutações ou super-expressão, esse gene induz a proliferação celular descontrolada, promovendo assim o desenvolvimento do cancro”.
Atualmente, não existem tratamentos efetivos aprovados para direcionar esse tipo de alteração nas leucemias; por esse motivo, os cientistas acreditam que esta nova abordagem representa um caminho promissor para o desenvolvimento de estratégias eficazes na inibição do gene MYC e dos seus parceiros oncogénicos.
Para alcançar estes resultados, a equipa de pesquisa usou várias técnicas avançadas em biologia molecular, sequenciamento de próxima geração e farmacologia para avaliar a eficácia e o mecanismo de ação deste fármaco tratamento de leucemias.
A equipa observou que a molécula ataca preferencialmente as células estaminais da leucemia, que impulsionam a disseminação da doença.
“Cada cancro é único! Este pormenor é muito importante, até porque, para aumentar a probabilidade de sobrevivência, a medicina de precisão é uma maneira promissora para o desenvolvimento de estratégias terapêuticas específicas para o paciente”, esclareceram os cientistas.
“É essencial analisar as diferentes caraterísticas de cada cancro em termos genómicos, epigenéticos e proteómicos para identificar as melhores terapias. A pesquisa sobre o reposicionamento de fármacos abre um novo caminho para opções terapêuticas inovadoras no tratamento do cancro”.
Nas últimas décadas, a taxa de sobrevivência de pacientes com leucemias pediátricas melhorou significativamente. No entanto, alguns pacientes permanecem resistentes às terapias atuais e dois terços ainda sofrem com os efeitos secundários a longo prazo, a sua maioria relacionada com a toxicidade dos tratamentos.
“A médio prazo, esperamos concluir a caraterização pré-clínica deste fármaco para, eventualmente, darmos início a novos ensaios clínicos. O nosso objetivo final é identificar estratégias terapêuticas mais específicas e menos tóxicas para crianças com leucemia caraterizada pelo gene MYC, a fim de melhorar as taxas de sobrevivência e qualidade de vida”.
Segundo estatísticas da Canadian Cancer Society, as leucemias são os cancros mais comummente diagnosticados em crianças com idades entre os 0 e os 14 anos, representando cerca de 32% dos casos de cancro infantil diagnosticados no Canadá.
Fonte: Eurekalert