O médico espanhol Ximo Duarte, especialista em oncologia pediátrica e em leucemia linfoblástica aguda, considera fundamental avançar com a produção de células CAR-T no meio académico em Portugal, que são a base para um tratamento de imunoterapia que se tem revelado promissor sobretudo contra cancros que afetam as células do sangue. Em Portugal, duas crianças foram já tratadas com este tipo de imunoterapia no Instituto Português de Oncologia de Lisboa (IPO de Lisboa).
O médico, que trabalha no IPO de Lisboa, esteve a liderar a aplicação de imunoterapia com células CAR-T pela primeira vez em Portugal em crianças. O IPO de Lisboa anunciou no dia 1 de junho passado ter realizado, em dezembro de 2022, a primeira terapia com células CAR-T numa criança em Portugal, a qual sofria com leucemia linfoblástica aguda. Numa entrevista ao jornal Público publicada no dia 3 de junho, o especialista avançou que uma segunda criança também já recebeu recentemente o mesmo tratamento.
Esta imunoterapia usa as células do próprio doente (os linfócitos T) para gerar uma resposta do sistema imunitário contra as células cancerosas. No âmbito deste tratamento, são retirados os linfócitos T do doente, os quais são modificados para conseguirem identificar moléculas estranhas ao nosso organismo (como as células cancerosas) e novamente administrados no paciente. Assim, quando essa infusão de linfócitos modificados (as CAR-T) reentra no corpo do doente, vai identificar as células cancerosas e reagir contra elas, eliminando-as.
A nível mundial, esta imunoterapia tem sido promissora sobretudo contra cancros que afetam as células do sangue. No panorama nacional, o tratamento de crianças com recurso à imunoterapia com células CAR-T “resume-se a um produto comercial [o Kymriah, da empresa farmacêutica Novartis]”, explicou o médico em entrevista ao Público.
Apesar dos importantes avanços feitos, Ximo Duarte considera que, “em Portugal, estamos muito atrás, quando comparado com o resto da Europa, na investigação e no desenvolvimento de células CAR-T na área da pediatria”. O médico destaca que, “em toda a Europa, há desenvolvimento de células CAR-T académicas”, o que não ocorre em Portugal.
E dá o exemplo paradigmático do Hospital Clínico de Barcelona, em Espanha, “que obteve, por parte da agência do medicamento espanhola, aprovação de um produto que é produzido nos hospitais e na academia – e não pela indústria farmacêutica”, destacando que “tem custos muito mais baixos e uma resposta mais rápida”.
“Quando pedimos a produção destas células CAR-T, demoram cerca de quatro semanas até estarem disponíveis para administração. São quatro semanas em que temos de tentar controlar uma doença que, normalmente nesta fase, já se revelou difícil de controlar”, explicou.
Ximo Duarte afirma, na entrevista, que “as CAR-T académicas têm a vantagem de não terem de ser transportadas para outro país. Os prazos são mais curtos e podem ser entre dez dias a duas semanas. É muito mais fácil de controlar a situação nestes períodos”, daí a importância de investir na produção destas células no meio académico em Portugal.
Fonte: Jornal Público (edição impressa)