Enquanto outras crianças da mesma idade estavam lutar para não terem de dormir a sesta, a pequena Michelle, com apenas 2 anos de idade, lutava contra um cancro agressivo e potencialmente fatal.
Os médicos do Hospital Infantil de Los Angeles, nos Estados Unidos, salvaram a sua vida numa “batalha épica” com um tratamento que está a ser apelidado de “bala mágica” na luta contra certos tipos de cancro.
O oncologista Leo Mascarenhas viu no fármaco larotrectinib uma promessa de tratamento quando ajudou a projetar um ensaio clínico que testou a segurança e eficácia deste medicamento; mas ninguém poderia prever o quão dramáticos seriam os resultados.
Diretor-adjunto do Centro Infantil para o Cancro e Doenças do Sangue e o Chefe da Seção de Oncologia, o médico acredita que este é um “fármaco notável. É, provavelmente, o medicamento mais impressionante que já vi na minha carreira”.
Apesar da atual eficácia da radiação e da quimioterapia, ainda existem alguns tumores que permanecem resistentes a estes tratamentos.
Os cancros geralmente são definidos pelo local onde crescem; da mesma forma, existe uma abordagem única para o tratamento em cada caso. Mas e se não houvesse essa limitação? E se, em vez disso, fosse possível encontrar um alvo comum que ligasse todos os tipos de tumores?
Acontece que alguns tipos de cancro compartilham anomalias genéticas que podem dar resposta a estas perguntas.
Os investigadores estão a analisar o ADN dentro de cada célula cancerígena para descobrir novas opções de tratamento direcionadas.
De forma a analisarem esta hipótese, os investigadores do Hospital Infantil de Los Angeles estão a implementar um ensaio especializado que testa o cancro de um paciente para vários marcadores biológicos.
Os resultados podem vir a ajudar os médicos a diagnosticar e tratar pacientes pediátricos com base na composição genética do tumor.
O regulador de saúde norte-americano (FDA) concedeu uma aprovação acelerada para o Vitrakvi (larotrectinib), um fármaco que atinge tumores com algo chamado fusão TRK – uma fusão de dois genes normais que, quando combinados, causam cancro.
Estima-se que as fusões TRK causem até 1% de tumores sólidos; mas ao contrário de algumas mutações causadoras de cancro, as fusões TRK podem causar a doença em qualquer tipo de tecido no corpo.
O larotrectinib é uma medicação oral que tem como alvo a fusão com TRK; este é o segundo medicamento aprovado pelo FDA que é “tecido-agnóstico”, não específico para a localização do tumor, mas sim para tumores baseados na genética.
O desenvolvimento e a aprovação do larotrectinib marcam um movimento em direção a terapias mais direcionadas para o tratamento do cancro.
Os investigadores do Hospital Infantil de Los Angeles supervisionaram o tratamento de vários pacientes pediátricos, incluindo o da jovem Michelle, como parte do ensaio clínico para o larotrectinib.
A história de Michelle desenrolou-se ao longo de apenas alguns dias, quando um tumor do tamanho de uma ervilha cresceu tanto que quase esmagou as suas vias aéreas; os médicos descobriram que o cancro de Michelle trazia uma fusão TRK.
No que só pode ser descrito como um esforço bem orquestrado, cirurgiões, oncologistas, pessoal de pesquisa clínica e até mesmo farmacêuticos do hospital trabalharam sem parar para que a pequena paciente tivesse acesso a esta medicação.
Esse esforço massivo não foi em vão – como a maioria dos pacientes envolvidos no estudo, Michelle sofreu uma redução rápida e dramática no tamanho do tumor.
Artigos publicados no New England Journal of Medicine e nas revistas Lancet Oncology e Cancer, demonstraram os resultados do estudo clínico, descrevendo a “atividade anti-tumoral rápida, potente e durável” do larotrectinib em pacientes de todas as idades com tumores de fusão TRK.
Os investigadores também realçam que, para além da rápida redução no tamanho do tumor, este fármaco também tem efeitos secundários “mínimos, em nada comparáveis com os da quimioterapia”.
“O larotrectinib é uma ‘bala mágica’ para tumores portadores de fusão TRK. Este fármaco não funciona num tipo particular de cancro, funciona em qualquer cancro que tenha a fusão TRK”, esclareceu o oncologista Leo Mascarenhas.