Cuidados com a pele na criança sob tratamento oncológico | PARTE 3

Cuidados com a pele

Mariana Cravo, Serviço de Dermatologia do IPO de Lisboa

O Transplante de Medula Óssea (TMO) é um tratamento utilizado em diversos tipos de doenças malignas do sangue e sistema linfático, nomeadamente leucemias e linfomas. Pode ser de dois tipos: alogénico, em que há recurso a um dador de medula óssea, ou autólogo, quando a medula utilizada é a do próprio doente. Antes da realização de ambos os tipos de transplante, há frequentemente necessidade de ser feita quimioterapia e/ou radioterapia, pelo que os efeitos secundários na pele destes tratamentos (descritos na parte 1 e 2) podem estar presentes no doente que é submetido a TMO.
De uma forma geral, quando é realizado um TMO, do ponto de vista da pele, as complicações mais frequentes são: doença de enxerto versus hospedeiro (DEVH), infecções, reacções adversas a medicamentos e aumento do risco de aparecimento de cancro de pele no futuro.

Doença de enxerto versus hospedeiro
Esta complicação é exclusiva dos transplantes alogénicos, porque resulta do risco de rejeição, que não ocorre quando é feito um auto-transplante. Pode ser aguda ou crónica e a sua gravidade é extremamente variável. A sua forma aguda ocorre nos primeiros meses após o transplante, e a pele é um dos órgãos mais frequentemente atingidos, sob a forma de inflamação e vermelhidão (com atingimento frequente do pescoço, palmas e plantas), xerose (secura da pele) e comichão.
No caso da DEVH crónica, que surge mais tardiamente após o transplante, a pele é afectada de diferentes formas, tais como aparecimento de rigidez e endurecimento (mais frequentemente na área das articulações, podendo causar uma limitação dos movimentos) e alterações da cor, com aparecimento de áreas de pele mais claras alternadas com áreas mais pigmentadas. No que concerne aos seus anexos, é frequente ocorrer queda e/ou alteração da textura do cabelo e alterações das unhas, podendo, inclusivamente, provocar a perda das mesmas, mais frequentemente nas mãos. São também comuns queixas de secura e descamação da pele, assim como comichão.
Estes efeitos secundários deverão ser abordados da mesma forma que foi descrita para quando os mesmos são causados pela quimioterapia.

Reacções adversas a medicamentos
Algumas vezes a inflamação e vermelhidão da pele que surgem pouco depois do TMO, não são devidas a DEVH, mas sim a um efeito secundário de um medicamento que faz parte do protocolo do transplante. A distinção entre estas causas nem sempre é fácil e, muitas vezes, apenas uma biopsia de pele ajuda no diagnóstico definitivo.

Infecções
Da supressão do sistema imunitário (imunossupressão) através de medicamentos, que é fundamental para o sucesso do transplante, podem resultar infecções. Estas afectam a pele de formas variadas. Na fase imediata ao transplante, manifestam-se na pele sob a forma de vermelhidões mais ou menos generalizadas, borbulhas com pús ou pequenos altos que podem ferir e ulcerar. Mais tardiamente é comum aparecerem verrugas virais (popularmente designadas por “cravos”). Estas lesões são contagiosas não só para a própria criança, no sentido em que se podem propagar, através do toque, para outras partes do corpo, mas também para outras crianças e mais raramente adultos que convivam com a criança transplantada. Dever-se-á evitar, dentro do possível, que a criança mexa, coce ou roa as verrugas (situação frequente quando estas surgem nos dedos das mãos) para evitar a sua propagação. Da mesma forma, o adulto que presta cuidados à criança deverá, sempre que houver necessidade de tratar/manipular as verrugas, usar luvas protectoras e desinfectar muito bem as mãos. Muitas vezes, infelizmente, e apesar dos tratamentos efectuados, as verrugas permanecem e, apenas com a diminuição da imunossupressão, se verifica um desaparecimento total das mesmas.

Aumento do risco de aparecimento de cancro de pele
A diminuição do sistema imunitário que se verifica na sequência do TMO diminui as defesas do organismo e a sua capacidade de destruir futuras células malignas que possam surgir. Neste sentido, a imunossupressão associada ao tratamento prévio com quimioterapia e/ou radioterapia, aumenta o risco de desenvolvimento de cancro de pele, muitas vezes anos após a realização do transplante. Assim sendo, todos os cuidados de protecção solar (referidos no texto “Protecção solar na criança com doença oncológica”) são fundamentais e deverão ser levados em conta a longo prazo.

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