“Agora, todas as pessoas são como nós”: a história de George

Todos os dias meço a minha temperatura. Ainda hoje, tenho máscaras cirúrgica e luvas descartáveis em minha casa. E ainda hoje, no porta luvas do meu carro, tenho desinfetante.

Ao contrário do que acontece na maioria da população, para mim, estes hábitos são velhos. Foram práticas que fui obrigada a tomar durante a minha última “prisão domiciliária”, quando passei mais de 5 meses dentro de um apartamento a cuidar do meu filho com cancro.

Estávamos em 2005 e o meu filho George, na altura com 5 anos, tinha acabado de ser sujeito um tratamento contra uma leucemia.

Apesar de ter entrado em remissão pouco tempo depois, as doses maciças de quimioterapia deixaram-no com um sistema imunitário bastante fragilizado. Digamos que, tal como está a acontecer neste momento a milhões de pessoas, de cada vez que o meu filho saía à rua estava a por a sua vida em risco.

Ele dizia que “não tinha soldados que o defendessem”; era assim que se referia aos glóbulos brancos que combatem doenças e que ele não possuía.

O corpo do meu filho não conseguia lutar.

Tal como acontece agora com o novo coronavírus, o COVID-19, a febre era um sinal de alerta.

No dia em que os médicos me explicaram isso, comecei a guardar termómetros nos bolsos, na carteira, no carro, em casa… sempre que o George tossia ou espirrava, eu media-lhe a temperatura. Se o meu filho tivesse 38º de febre, íamos diretos ao hospital.

Toda a minha vida estava preparada para estas situações. Para alem dos termómetros, das máscaras, a bagageira do meu carro estava cheia de roupa e brinquedos, para o caso de o George ter de ser internado.

Quando isso acontecia, o procedimento era sempre o mesmo: os médicos colocavam o meu filho numa maca, davam-lhe antibióticos por via intravenosa e, durante 3 dias, o meu filho era sujeito a exames, sessões de hidratação, repouso e quarentena.

Na primavera de 2006, os médicos disseram-nos que os tratamentos iam chegar ao fim. O sistema imunitário do George iria conseguir recuperar.

Ainda assim, o meu filho seguiu o protocolo até aos 9 anos de idade. Durante esse tempo, munida de termómetros e atenta a todos os sinais, continuei a medir-lhe a temperatura regularmente e, em alturas em que o sentia mais em baixo e frágil, impunha quarentenas domiciliárias, ainda que com uma duração não superior a alguns dias.

Quando a pandemia de coronavírus começou a fazer manchetes por todo o mundo, liguei ao meu filho.

O George tem agora 19 anos. O cancro roubou-lhe grande parte da infância, e agora, um maldito vírus está a roubar-lhe uma das grandes aventuras da sua vida: o primeiro ano da universidade.

Quando regressou a casa, abraçou-me.

“Já passámos por uma situação como esta antes. Já sabes o que temos de fazer”, disse-lhe eu.

“Sim mãe, já passámos por isto”, respondeu-me ele com lágrimas nos olhos. “Agora, todas as pessoas são como nós”.

Jere e o seu filho George, agora com 19 anos. – Fonte: DR

Texto redigido por Jere Downs, mãe de um sobrevivente de cancro infantil

Fonte: The Philadelphia Inquirer

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