Cancro Infantil: 12 razões para termos esperança no futuro

Pode parecer assustador, mas em 99% dos casos, o cancro é uma doença que está relacionada com a idade.

Por vezes, as células do nosso corpo perdem as suas batalhas contra as toxinas a que estamos expostos, contra os estilos de vida sedentários que levamos, contra os vírus que contraímos à medida que a nossa idade avança e contra as predisposições genéticas – o resultado? As toxinas proliferam de forma incontrolável.

Mas se em 99% dos casos o cancro está relacionado com a idade, os cerca de 1% restantes ocorrem em crianças.

É uma realidade particularmente cruel aquela que põe à prova bebés, crianças e adolescentes que, no auge da sua inocência, se deparam com um diagnóstico de cancro. Mas mesmo assim, existe mais esperança no mundo do cancro pediátrico do que no mundo do cancro dos adultos.

Talvez porque as crianças sejam mais inocentes, mas também porque os corpos dos jovens toleram a quimioterapia agressiva muito melhor que os dos adultos, a verdade é que as taxas de sobrevivência entre as crianças são maiores.

Mais, a insondável injustiça da situação obrigou especialistas a criar novos tratamentos o mais rápido que conseguem.

Alguns dos principais impulsionadores destes novos tratamentos foram os hospitais da cidade de Denver, nos Estados Unidos, onde investigadores se tornaram peças importantes nesta corrida para salvar vidas jovens.

Com a ajuda de cientistas locais, médicos e pacientes, um grupo de jornalistas quis entender melhor de que forma o cancro infantil difere do cancro em adultos. Dessa investigação, que avaliou as diferentes fases da doença – diagnóstico, tratamento e sobrevivência, os jornalistas chegaram a uma conclusão: existem 12 razões pelas quais podemos ser otimistas em relação ao futuro da oncologia pediátrica.

Razão nº 1: As crianças têm cancros que diferem daqueles encontrados em adultos

O mundo da oncologia usa muitos termos desconhecidos, a maioria dos quais parecem-se com sopas de letras de palavras que nunca ninguém havia lido.

Mas em termos do cancro infantil, convém que nos lembremos de duas palavras, sangue e cérebro, que dizem respeito aos cancros do sangue (como as leucemias) e aos cancros cerebrais, os que mais atingem as crianças.

Contudo, os tumores pediátricos também se desenvolvem nos ossos, nos rins, no fígado, no sistema nervoso, no tecido conjuntivo entre os órgãos e no sistema linfático.

“A nossa população de pacientes é representativa destas diferentes formas de cancro”; disse Lia Gore, diretora do Programa de Hematologia Pediátrica, Oncologia e Transplante de Medula Óssea do Children’s Hospital Colorado.

Apesar de os mais jovens também poderem desenvolver os chamados “cancro de adultos”, isso é relativamente raro. E, segundo Lia Gore, “isso é bom”.

A vantagem relativa de alguns dos mais comuns cancros pediátricos, como os cancros do sangue e cerebrais, é que muitos dos tratamentos para estes cancros específicos produzem resultados muito positivos (embora muitos cancros de adultos tenham altas taxas de sobrevivência a 5 anos, as taxas de sobrevivência ao cancro pediátrico são consideravelmente melhores.)

Os jovens do Colorado com cancro no cérebro e no sistema nervoso têm uma taxa de sobrevida a 5 anos de 73%; por outro lado, 88% das crianças com linfomas de Hodgkin e não-Hodgkin vivem por, pelo menos, 5 anos após o diagnóstico.

Também a leucemia linfoblástica aguda, o tipo mais comum de leucemia em crianças, é um dos tipos de cancro que melhor responde aos tratamentos; nos últimos anos, os oncologistas conseguiram resultados tão positivos que, hoje em dia, cerca de 90% dos pacientes diagnosticados com leucemia infantil mantém-se em remissão após 10 anos.

Razão nº 2: As crianças toleram melhor a quimioterapia do que os adultos

As crianças têm uma vantagem sobre os adultos no que toca ao cancro: embora não sejam imunes às reações desconfortáveis, normalmente conseguem lidar melhor com doses mais agressivas de quimioterapia.

De acordo com o Brad Ball, hematologista pediátrico e oncologista no Rocky Mountain Hospital for Children, os jovens recebem doses maiores tratamento do que os adultos, tendo em conta o peso corporal.

Segundo Anna Franklin, oncologista no Children’s Hospital Colorado, as crianças recuperam mais rapidamente das toxinas do que os adultos, porque elas não tendem a ter problemas de saúde adicionais – como problemas nos pulmões ou nos rins – e os seus corpos em desenvolvimento adaptam-se bem a novos estímulos.

Este foi o caso de Brenden, um menino que, com 5 anos, foi diagnosticado com um rabdomiossarcoma. A pouca idade de Brenden e a deteção acidental, mas precoce, do tumor provaram ser uma bênção quando o menino foi sujeito a 40 semanas de quimioterapia e a 20 sessões de radioterapia. Brenden tolerou a quimioterapia tão bem que foi capaz de frequentar de forma regular o jardim de infância.

E o seu prognóstico é otimista: cerca de 70% das crianças com este tipo de tumor não terão sinais de recidiva 5 anos após o diagnóstico.

O pequeno Brenden Woodward no seu último dia de tratamento. – Fonte: Shashana Woodward

Razão nº 3: Estão a ser desenvolvidos mais medicamentos para tratar o cancro infantil

Ao longo da história da oncologia existem muitas datas importantes que devem ser relembradas: a 29 de março de 1896 utilizou-se, pela primeira vez, a radioterapia enquanto tratamento oncológico; no dia 5 de agosto de 1937, foi criado, nos Estados Unidos, o National Cancer Institute; e foi no dia 28 de dezembro de 1947 que os médicos observaram uma das primeiras remissões num paciente com cancro.

Contudo, uma das datas mais importantes aconteceu há um ano atrás, quando o Congresso norte-americano aprovou uma lei que exige que as empresas que desenvolvem medicamentos contra o cancro para adultos tenham sempre que considerar a eficácia desses medicamentos também para crianças.

Anteriormente, as empresas recebiam a aprovação do regulador de saúde norte-americano (FDA) para o uso dos medicamentos em adultos e só depois é que, eventualmente, testavam esse medicamento em crianças, algo que demorava anos.

“É muito difícil lidar com esta espera, com estes atrasos, principalmente quando se é pai de uma criança com cancro”, lembra Lia Gore.

A médica Lia Gore. – Fonte: DR

Embora os investigadores já tenham visto algumas melhorias desde a implementação da lei, a verdade é que Lia Gore recorda que, já antes, muitos médicos tinham tentado vias alternativas para conseguir ter um melhor acesso aos medicamentos.

No início dos anos 2000, os profissionais do Children’s Hospital Colorado, juntamente com outros médicos de diversos hospitais do país, lideraram um movimento que pretendia criar a existência de um contato direto entre fabricantes de medicamentos já aprovados, médicos e pacientes; como os fármacos já haviam sido considerados seguros pela FDA, as suas aprovações para uso pediátrico poderiam ser aceleradas.

Lia Gore lembra também que, muitas vezes, o facto de investigadores e médicos trabalharem nos mesmos edifícios permite que haja uma maior conversação, o que pode levar ao desenvolvimento mais rápido de fármacos promissores.

E este pormenor é muito importante pois, entre 1979 e 2016, apenas 5 medicamentos para uso específico em pacientes pediátricos com cancro foram aprovados.

Nos últimos anos, o Children’s Hospital Colorado tem servido como um “abrigo” a ensaios clínicos de múltiplos medicamentos para o cancro infantil e esta é, segundo os cientistas, uma boa notícia para os pacientes.

“Seria importante que todos os profissionais de saúde que lidam com o cancro infantil pensassem um bocadinho ‘fora da caixa’”, disse Lia Gore.

Razão nº 4: Existem cada vez mais crianças com cancro matriculadas em ensaios clínicos

Hoje em dia, mais de metade dos pacientes com cancro pediátrico com menos de 15 anos recebem cuidados médicos por meio de um ensaio clínico.

A explicação é simples: tem tudo a ver com números. O cancro pediátrico é tão raro que os hospitais precisam de designar os seus pacientes para ensaios clínicos, realizado em vários locais, de maneira a trabalhar de forma colaborativa para obter tratamentos mais eficazes.

Se assim não fosse, a verdade é que muitos dos cancros que hoje são considerados “fáceis de tratar” ainda seriam uma verdadeira dor de cabeça para os profissionais de saúde.

Razão nº 5: O apoio do melhor amigo do homem

Considerados o melhor amigo do homem, os cães podem vir a ser grandes aliados na luta contra o cancro infantil.

O campo da oncologia comparativa – o estudo do cancro em pessoas e animais de estimação para beneficiar ambas as espécies – muitas vezes analisa os cães, pois estes partilham mais de 80% dos genes com o ser humano.

“Se pensarmos no cancro como uma doença que ocorre porque os genes sofrem mutações, quanto mais semelhante for o genoma, mais provável será o mesmo tipo de tratamento funcionar”, disse Nicole Ehrhart, professora de oncologia cirúrgica na Universidade Estadual do Colorado, líder internacional neste campo há 30 anos.

Ao longo de várias décadas, a pesquisa em cães levada a cabo pela instituição- na qual os ensaios clínicos são semelhantes aos realizados em pacientes com cancro – ajudou na aprovação de medicamentos para o tratamento de cancros, que variam leucemias e neoplasias ósseas, por parte da FDA.

Atualmente, Nicole Ehrhart está focada em tentar melhorar as técnicas de reconstrução óssea e musculares.

“Quando substituímos mecanicamente uma parte do osso da perna, esse osso não volta a crescer. Ao longo da vida, adolescentes que foram amputados precisarão de ser submetidos a inúmeras cirurgias, entre 15 a 30, porque os dispositivos implantados após a amputação experimentam desgaste, falhas mecânicas e infeções”, disse a investigadora.

Na sua pesquisa, Nicole está a analisar se as células estaminais retiradas de gordura, medula óssea ou tecido muscular podem regenerar ossos e músculos de cães que tenham desenvolvido um qualquer tipo de cancro que afete essas partes do corpo. Se o seu trabalho for bem-sucedido, a investigadora espera estabelecer bases para que a pesquisa seja feita em humanos.

Razão nº 6: Há exceção de um, todos os tumores cerebrais pediátricos são curáveis

É chamado de glioma pontino intrínseco difuso, um apelido que combina com a complexidade da anatomia deste cancro.

No caso do glioma pontino intrínseco difuso, as suas engenhosas células cancerígenas crescem entre as células normais, alojando-se no tronco cerebral, que controla a respiração e a deglutição, o que significa que a cirurgia não é uma opção.

O problema é que o glioma pontino intrínseco difuso também se mostra invulnerável ​​à medicação e, enquanto a radioterapia consegue encolher o tamanho do tumor, ele nunca chega, na realidade, a desaparecer.

Daí que expetativa de vida a seguir ao diagnóstico seja inferior a 1 ano.

Mas as estatísticas não derrubam Adam Green, oncologista no Children’s Hospital Colorado que, há mais de 7 anos, no funeral do seu primeiro paciente com glioma pontino intrínseco difuso, prometeu melhorar a taxa de sobrevivência de outras crianças afetadas pela doença.

Isso ainda não aconteceu, mas o médico e a sua equipa não desistem de lutar. Os investigadores acreditam ter conseguido isolar o gene mutado que impulsiona o crescimento do glioma pontino intrínseco difuso. Agora, a equipa está a tentar compreender como é que este gene causa mudanças nas células e quais medicamentos – novos ou já aprovados – podem ser capazes de direcionar essas mudanças problemáticas.

Ao mesmo tempo, os investigadores não abandonaram os tratamentos tradicionais, e acreditam que a quimioterapia certa pode ter um impacto sobre o glioma pontino intrínseco difuso: “só” precisam de encontrar a combinação de fármacos que seja capaz de dizimar as células cancerígenas.

“Dar a uma criança de 3 anos uma esperança de vida de mais 1 ou 2 anos não pode ser uma opção. Não podemos aceitar isso, simplesmente não podemos”, disse o médico.

Razão nº 7: Os médicos são treinados para cuidar de uma população difícil de tratar

Antes de Andrew Diaz-Saldierna ter sido diagnosticado com um linfoma, o jovem passava as suas noites a treinar com a bola nos campos de beisebol da sua escola secundária.

Mas quando a sua vida foi interrompida pelo cancro, Andrew, na altura com 16 anos, viu-se obrigado a trocar os relvados por uma cama, o local onde recuperou das dores e náuseas que o tratamento lhe causava.

Embora os efeitos secundários ​​da quimioterapia estejam bem documentados, reações graves como a de Andrew são já consideradas são atípicas.

Andrew durante os tratamentos. Fonte: DR

Assim como Andrew, qualquer pessoa entre os 15 e os 39 anos que seja diagnosticado com cancro não se enquadra nem na ala pediátrica, cheia de crianças, nem na unidade oncologia de adultos, geralmente mais povoada por uma população geriátrica.

E não se trata apenas de encontrar um lugar que seja confortável. Os tumores de adolescentes e de jovens adultos tendem a ser biologicamente diferentes também.

As variações moleculares podem ser a chave para explicar o porquê de, por vezes, estes pacientes responderem mal a tratamentos que funcionam bem noutras populações ou ainda o porquê de as taxas de sobrevivência nesta população não terem melhorado tanto quanto as de crianças pequenas ou adultos mais velhos.

Mas a boa notícia é que o Children’s Hospital Colorado e o Rocky Mountain Hospital for Children estão bem equipados para dar apoio a estes pacientes. Ambos os hospitais ficam ao lado e têm relacionamentos com centros médicos para adultos, o que torna relativamente indolor movimentar os pacientes de um lado para o outro, conforme necessário. Para além disso, cada centro médico emprega um médico que é certificado em oncologia pediátrica e em medicina interna, o que significa que é alguém com experiência em ambos os reinos: o dos adultos e o das crianças e adolescentes.

“É necessário criar-se um ambiente onde estas pessoas se sintam à vontade e integradas. Idealmente, não se teria um jovem de 18 anos com cancro nem ao lado de uma criança com 5 nem de uma mulher de 60. Estes jovens adultos precisam de encontrar uma normalidade, um grupo de pessoas que os entenda”, disse Anna Franklin, outra profissional do Children’s Hospital Colorado.

O treino dos médicos é fundamental, e a verdade é que, no Rocky Mountain Hospital for Children, 93% dos pacientes com dois tipos de neoplasias ósseas que estão vivos 10 anos após o diagnóstico.

Os médicos creditam uma técnica chamada quimioterapia intra-arterial para este sucesso.

O tratamento requer radiologistas para isolar os principais vasos sanguíneos que alimentam um tumor e infundir altas doses de quimioterapia através dessas artérias, o que os médicos acreditam que proporciona um impacto mais direto no cancro. O procedimento é repetido a cada 3 semanas até que, pelo menos, 90% cento do fluxo sanguíneo para o tumor seja interrompido, o que permitirá aos médicos remover o tumor cirurgicamente.

O Rocky Mountain Hospital for Children é um dos poucos centros no mundo que utilizam este método.

Razão nº 8: As crianças já podem contar com a imunoterapia

No mundo da oncologia, os investigadores são uma espécie de super-heróis, que mantêm a esperança quando tudo parece perdido e que não descansam enquanto não descobrirem como destruir as células vilãs.

Por isso, quando Terry Fry deixou o National Cancer Institute para ser o co-diretor da Unidade de Imunologia Humana e Imunoterapia na Universidade do Colorado, o instituto sentiu-se como se Gotham City tivesse perdido o Batman.

O “Batman” Terry Fry. – Fonte: DR

Em 2015, Terry Fry foi um dos primeiros médicos a conseguir modificar as células imunes de pacientes pediátricos de uma forma que permitiria aos médicos 0atacar a leucemia linfoblástica aguda. Normalmente, o sistema imunitário reconhece as células danificadas como uma séria ameaça e tenta livrar-se delas; mas é difícil para o sistema imunitário reconhecer células cancerígenas pediátricas porque, geralmente, elas não parecem ser muito diferentes das células normais.

Felizmente, todas as células podem ser distinguidas por proteínas específicas e assim, Terry Fry e outros colegas conseguiram transformar os linfócitos T, um tipo de glóbulos brancos cruciais para a função imunitária, em “super soldados” projetados para localizar e eliminar todas as células que expressam essas proteínas.

Dizer que o tratamento é eficaz parece, por vezes, um eufemismo, tendo em conta que entre 70 e 90% dos pacientes entraram em remissão completa.

Mas estas “células soldados” não são necessariamente a solução definitiva. As células cancerígenas podem evoluir rapidamente e têm o potencial de livrar-se dessas proteínas conspícuas para evitar a deteção.

E é aqui que entra a nova pesquisa de Terry: como existe mais do que um tipo de proteína em cada célula cancerígena, o investigador está a desenvolver novos tratamentos que visem várias proteínas simultaneamente. Terry espera poder lançar um ensaio clínico este ano.

O médico também está a investigar fármacos que possam aumentar a expressão das proteínas e a analisar quais as proteínas menos propensas a desaparecer das células cancerígenas.

“Não podemos descansar e ficar a vangloriarmo-nos dos avanços que temos feito nos últimos 4 ou 5 anos. Temos que continuar a trabalhar”, disse o cientista.

Razão nº 9: O tratamento do cancro pediátrico implica mais do que apenas medicação

Quando os adultos entram num consultório, esperam ser recebidos pelo seu médico e, talvez, por uma enfermeira. Mas a realidade é diferente quando se fala de pacientes com cancro infantil.

Nos Estados Unidos, em alguns hospitais, além de vários médicos, uma criança com uma neoplasia geralmente terá de ser vista por um psicólogo, um assistente social, um especialista em vida infantil (para ajudar as crianças a lidarem com coisas como fobias a agulhas), um terapeuta artístico, um especialista em educação e uma pessoa que tenta encontrar recursos financeiros e comunitários para a família afetada.

Esta extensa equipa de bem-estar é construída com base na premissa de que o cancro não ocupa apenas parte do corpo – esta é uma doença que toma conta da vida dos pacientes e de todos aqueles à sua volta.

É por isso que o Children’s Hospital Colorado tem à disposição assistentes sociais e especialistas em vida infantil para as famílias logo após estas receberem um diagnóstico e bem antes de começarem a enfrentar, como resultado do tratamento, múltiplos desafios. Infelizmente, esta interação precoce é uma raridade quer no mundo dos adultos quer em outros hospitais pediátricos.

Introduzida no início do processo, esta equipa de 20 pessoas tem uma oportunidade única de construir relacionamentos com os pacientes e suas famílias. E às vezes, dizem, é esse apoio que faz com que as pessoas continuem a lutar.

Razão nº 10: Os médicos trabalham todos em prol de um bem comum

Quando, na década de 1940, os oncologistas pediátricos tiveram acesso à quimioterapia, na altura conhecida como “a assassina do cancro”, logo começaram a pensar em maneiras de melhorar o tratamento e rapidamente reconheceram a necessidade de reunir os seus conhecimentos.

“Já na altura os médicos perceberam que o cancro pediátrico era muito raro e que a única maneira de o tentar combater seria partilhando informações, nacional e internacionalmente”, disse a oncologista Jennifer Bruny.

Essa constatação levou à criação de várias organizações na década de 1950 que, em conjunto, acabariam por dar origem ao Children’s Oncology Group, em 2000. Foram algumas dessas organizações que estabeleceram padrões para o tratamento do cancro e criaram parcerias de partilha de dados entre médicos e instituições a nível mundial.

“Se eu tiver uma duvida, sei que posso contar com a comunidade de oncologia pediátrica em geral para me responder, sejam os médicos dos Estados Unidos ou de outro país qualquer”, disse Brad Ball, do Rocky Mountain Hospital for Children.

A maioria dos oncologistas pediátricos apontam esta linha aberta de comunicação como uma das principais razões para o aumento impressionante nas taxas de sobrevivência a 5 anos para os pacientes pediátricos – de 10% para mais de 80% nos últimos 60 anos.

Razão nº 11: A infertilidade já não é um tema tabu

A quimioterapia foi projetada para eliminar as células que crescem rapidamente no corpo; contudo, não atinge apenas as malignas que se começaram a dividir descontroladamente. Os óvulos femininos e os espermatozoides masculinos enquadram-se na primeira categoria, o que pode apresentar problemas para pacientes com cancro que ainda não atingiram a idade fértil ou que ainda não tenham sido pais.

Até há cerca de 10 anos atrás, esta era uma questão raramente discutida; a preservação de óvulos era considerada experimental até 2012.

Além disso, acredita a oncologista Anna Franklin, falar sobre a fertilidade de uma criança ainda era “considerado impróprio”.

“Não nos podemos esquecer que, há 30 anos atrás, não se dizia ‘cancro’, era a ‘palavra C. Todas as pessoas sussurravam quando se falava da ‘palavra C’ e acontecia o mesmo com o sexo. Esse é um dos motivos para que muitos oncologistas não falem de sexo com os seus pacientes. Eles não foram treinados para falar sobre fertilidade.”

Quando grupos de defesa começaram a aumentar a consciencialização sobre o problema da fertilidade em sobreviventes de cancro infantil, as sociedades médicas norte-americanas tentaram dar resposta, criando diretrizes que educavam os provedores.

Hoje em dia, quando Anna Franklin inicia uma consulta no Children’s Hospital Colorado, por exemplo, a fertilidade é tratada como um possível efeito secundário da quimioterapia, pelo que a médica questiona sempre o paciente se já considerou ser mãe ou pai.

“A maioria deles nunca tinha pensado nessa questão”, diz a médica.

Embora a discussão possa ser desconfortável, uma pesquisa mostrou que os pacientes e as suas famílias consideram a abordagem ao tema “fertilidade” como algo bastante positivo.

“Durante o diagnóstico e o tratamento, pais recebem muitas notícias más, mas neste caso estamos a pensar no futuro dos filhos deles”, diz Serena Dovey, endocrinologista da Universidade do Colorado.

Razão nº 12: Os efeitos secundários tardios resultantes do tratamento já estão a ser investigados e tratados

Uma vez por mês, um grupo incomum de pessoas dirige-se a um centro muito especial, o TACTIC -Thriving After Cancer Treatment Is Complete (algo como “prosperar após o tratamento do cancro”, em português).

Todos têm algo em comum: são sobreviventes de cancro infantil, têm 21 anos, ou mais, e estão em remissão há, pelo menos, 5 anos.

Os sobreviventes de cancro infantil podem ter que lidar com uma série de problemas, desde déficits hormonais a problemas cardiovasculares, ou mesmo problemas cognitivos. A maioria destes problemas são potenciais consequências dos fármacos que, em determinado momento, salvaram aqueles sobreviventes do cancro.

Como cada vez mais pessoas, felizmente, sobrevivem ao cancro infantil, os oncologistas têm agora oportunidade de observar os efeitos secundários tardios a surgirem. O que os profissionais do TACTIC tentam fazer é identificar e tratar esses problemas.

Neste centro, os sobreviventes são observados por um oncologista, um enfermeiro, um médico geral e um psicólogo; caso seja necessário, os pacientes podem ser encaminhados para outros especialistas.

“Muitas vezes, quando os sobreviventes terminam o tratamento, deixam de ser tão acompanhados como deveriam ser”, disse Brian Greffe, um dos oncologistas pediátricos que ajudou a fundar o TACTIC, há quase 10 anos.

“Estamos a capacitar estas pessoas. A ensiná-los a cuidarem de si”.

Fonte: 5280

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